Recentemente, minha filha tristemente me falou:
- Mãe! Perdi minha identidade. O que sou? Professora, não posso dizer
que sou, pois, os alunos nos impedem de ensinar, não apresentam nenhum
interesse em aprender, em crescer intelectualmente e muito menos estão
preocupados com o futuro. A senhora sempre me disse que eram muitas vezes
babás, psicólogas, enfermeiras... quem me dera! Onde trabalho só se vê
profissionais frustrados, maltratados, insultados por seus alunos e pais. Depois
de quatro anos de estudo numa faculdade estadual muito conceituada, onde me
dediquei, dando o melhor de mim deixando diversões, passeios, muitas vezes
sacrificando horas de repouso eu pergunto: o que sou?
Fiquei olhando para ela também com muita tristeza, pois infelizmente
tive que concordar. O professor perdeu sua identidade.
Realmente, sempre foi uma boa aluna, responsável, nunca nos deu nenhum
tipo de trabalho. No último ano de faculdade prestou concurso, mais para
avaliar-se, pois ainda não possuía o diploma e foi aprovada. A primeira vez que
foi chamada, não pode assumir por não ser ainda formada, mas devido à falta de
professores da área, ela foi novamente chamada no ano em que completava o
curso. Foi uma correria, a direção teve que antecipar o diploma para que
assumisse o cargo. Imaginem a alegria e o entusiasmo que iniciou a carreira.
Embora tivesse escolhido sua sede em uma cidade meio violenta, nada a
desanimava. Em janeiro já iniciou o preparo das aulas de maneira atualizada,
criativa, buscou os melhores livros. Tive a certeza que seria uma excelente
educadora.
Sem querer desanimá-la, mas ponderando, disse que ela encontraria nível
bem diferente do qual esperava, pois, antes de aposentar-me eu já tomei a
consciência dos rumos decadentes que tomava a escola pública. Aposentei-me
cedo, mais pela decepção, constatação triste de uma profissão desvalorizada.
Um ano bastou para assassinar todos os sonhos dela. O que encontrou foi
exatamente turmas semi-analfabetas que de matemática dispunham de meras noções
básicas.
Mesmo assim, ela buscou voltar à matéria, sanar a defasagem imensa, mas
alunos de oitava série que não dominam as quatro operações, números decimais,
expressões simples é praticamente impossível recuperá-los.
Na tentativa de incentivá-los, ela implantou no Orkut uma brincadeira
muito interessante. Criou uma comunidade: “Você já sentou na cadeirinha? ”. Foi
uma dose de ânimo, principalmente no incentivo à disciplina. Quando o aluno se
excedia falando palavrões, muito comum para eles, ou recusavam a participar da
aula, também muito comum, pois ninguém em casa exercia nenhum tipo de
autoridade sobre ele, ela o colocava por alguns minutos na cadeirinha. Depois
eles registravam a experiência no Orkut, foi um sucesso, pois iniciou um
esforço por parte dos alunos em não experimentarem a cadeirinha. Mas, bastou a
filha da secretária da escola sentar na cadeirinha para haver todo um drama em
que todos da direção acharam que deveria ser excluída essa comunidade, pela
humilhação que esta conferia ao aluno. Foi quando ela desistiu de resistir.
Passou a exercer seu cargo, já agora com bem pouco estímulo.
Esse dia, ela deu três aulas seguidas na mesma turma. Uma menina, ou
menino: tinha nome e ficha do sexo feminino, mas comportava-se e se vestia como
pessoa do sexo masculino, tirou o dia para aprontar de tudo: falava alto,
debochava dos colegas, recusava-se a participar da aula... por incrível que
isso possa parecer, meus queridos leitores hoje em dia isso acontece numa sala
de aula e o professor não pode fazer absolutamente nada! Mas quando ela
percebeu que a professora mantinha a calma, ignorando e procurava dar andamento
em sua aula ela decidiu tirar a roupa dentro da sala. Segundo minha filha ela
chegou a tirar a calça, mostrando uma cueca amarela.
A essa altura, não tinha mais como aturar. Ela avisou a diretora e pediu
que a pessoa se retirasse da sala. Ao passar por ela, a pessoa em questão,
deu-lhe um tremendo empurrão jogando-a contra a parede.
Professora não pode nem se alterar com aluno,
mas aluno pode agredir professora? O que aconteceu com a tal pessoa? A diretora
prometeu expulsão, mas não se pode deixar adolescentes sem escola segundo a lei
dos Direitos da Criança e Adolescentes! Engraçado, como eles têm tantos
direitos e nenhum dever.
Minha filha, em choque, me ligou e
o pai imediatamente foi buscá-la. Ele ficou no limite, chegando ao cúmulo de
tirar satisfações com a pessoa. Ela disse sarcasticamente:
- Eu não fiz nada, só dei um
empurrão nela.
O pai achava inadmissível tal comportamento, pois nossa filha foi
educada exatamente com a ideia de que professor é uma autoridade na sala de
aula e deve ser respeitado como tal. Queria de qualquer maneira fazer um
Boletim de Ocorrência. Eu dei apoio, para que sirva de exemplo para os demais
alunos e isso não suceda mais nem com minha filha nem com as demais professoras
da escola, mas já sei de antemão que vai dar em nada.
Infelizmente esse é o ambiente que os
professores e alunos passam a maior parte de seu dia. Horário que seria
dedicado ao crescimento cultural, aprendizagem, esclarecimento de dúvidas é
quase que totalmente perdidos com discussões, desrespeito com os mestres,
brigas paralelas, desinteresse em tudo o que está sendo ensinado.
Livro: SE OS PAIS E PROFESSORES DEREM-SE AS MÃOS
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